sábado, 22 de fevereiro de 2014

Havia muitos Ludgeros, mas ele era um só

Entre as virtudes que mais me impressionavam no eletricitário aposentado Ludgero Luis Marques, político nato, ser humano de índole reta e de grande coração, era a forma prática como ele tratava as coisas. Aquilo que dependia dele tinha solução rápida. Seja pelo emocional generoso, seja pelo raciocínio privilegiadamente lógico e justo, suas decisões eram quase imediatas. Eu poderia aqui destacar tantas outras, mas talvez esse Ludgero prático foi quem derivou outros tantos Ludgeros que o imaginário popular construiu. Mas Lugero Luis Marques era só um e sua singularidade não teve nada de banal.

Num período de pelo menos doze anos eu convivi com ele, em contato, se pode dizer, quase diário. Testemunhei ele ser bom para uma penca de gente. Inclusive para mim, que tive sua mão estendida em momentos complicados (era um termo que ele adorava). Os meus próprios conceitos, os quais formei sobre certo e errado em relação à política e aos políticos, aos entes públicos e à sociedade, posso dizer que tiveram grande influência deste ser público que tinha opinião sobre tudo. Ludgero lia muito, ouvia muito. Quando disparava suas convicções era porque já tinha dissecado todas as faces do fato e da informação.

Ludgero também me incentivou muito na minha formação profissional. Jornal na rua, entrevista no ar, sua opinião – nem sempre elogiosa – me ajudou muito para o indispensável equilíbrio que necessita ter um repórter ou um colunista que trabalha com informação e também com opinião.    

Ludgero e a política tiveram um caso de amor explícito e permanente. Se elegeu vereador logo após se aposentar da CEEE, a qual o designou como seu gerente regional, no final da década de 1980. Para Pelotas, sua terra berço não voltou mais. Por bastante tempo foi umas das referências da Câmara de Camaquã, a presidindo por mais de uma oportunidade. Também foi secretário municipal e presidente local da sua sigla. Pela reconhecida habilidade, foi convidado para coordenar três campanhas estaduais na região. Na primeira delas, em 1994, ajudou o jornalista Antônio Britto a se tornar governador. Com o mesmo Britto trocou de partido e participou da campanha de 2003 pelo PPS. A eleição foi vencida por Germano Rigotto e o PMDB, que quatro anos depois tinha Ludgero de volta e o colocou novamente como coordenador regional de campanha.  

Ludgero Luis Marques faleceu neste sábado, sem ter tempo de realizar um dos sonhos que nutriu por anos: se tornar prefeito de Camaquã. Planejava uma cidade moderna, construída a partir das produtivas relações que fez ao longo dos anos com os protagonistas políticos de Porto Alegre e de Brasília. E essa rede era ampla. Mas Ludgero viveu bem. Com a esposa Ana, com quem teve a filha Marisse, teve um convívio harmonioso e blindado por décadas. Com Ana, Lugdero viajou pelo Brasil e conheceu vários países. O casal compartilhou muitas conquistas.

A última diplomação
Ludgero se despede deste plano de cabeça erguida, após brigar bravamente pela vida, a qual amava demais. Dos seus 72 anos, dois foram de tratamento, nos quais não faltaram gestos de dignidade e de força pessoal. Exemplo disso foi dado no dia em tomou posse para o seu último mandato de vereador, no primeiro dia de 2013. Mesmo abatido e com a cabeça enfaixada após ser operado, Ludgero optou em receber pessoalmente o diploma da Justiça Eleitoral. Os poucos metros que separavam a cadeira em que estava da mesa de autoridades pareceram quilômetros. Com passos embaralhados, mas com a cabeça erguida e olhar altivo, ele recebeu o diploma após apertar firme a mão de cada um dos componentes da mesa. O esforço foi reconhecido por todos que estavam no IFSul, que aplaudiram demoradamente a coragem. 

A mesma determinação o fez comparecer, já extremamente debilitado, a sessão legislativa desta semana. Ludgero era assim: um otimista, um teimoso, que lutava até o fim por aquilo que achava bom e por aqueles que ele julgava merecer o melhor. Até o seu último dia. 
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Por Alex Soares    

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