sábado, 20 de agosto de 2011

A catarse de um símbolo

Não, José Cândido não era um sujeito convencional. Tinha tudo para ser, mas não foi. Nascido e criado em berço abastado, ele tinha tudo para seguir a cartilha social recomendada. Até ensaiou, mas não conseguiu. De intocável, optou em enveredar por outra trilha. Cedo, sentiu-se melhor em meio à palutéia e dela não se desgrudou mais. O bom acolhimento foi decisivo à opção de vida que fez: a política. Foram quatro mandatos – um como vereador e três como prefeito.

No setor público, guindou e elegeu gente. Fora dele, ajudou outros tantos. Da conta de luz atrasada ao quarto de vaca para o casamento da filha, lá estava a mão do Tio Zé. Ele entendia como poucos essa sinergia. Dinheiro trocado nos bolsos, na porta do gabinete, chamava um a um. Às vezes, com alguma advertência, alcançava cinco reais para um, 10 para outro e assim ia. Por ter lido bem a faixa carente e suas demandas mais primárias, fazia isso de maneira instintiva. Os críticos de Zé Cândido nunca lhe pouparam rótulos. Para eles, o trabalhista “comprava os pobres, os explorava”. Se olhar invertidamente, Zé Cândido é que foi o explorado.

Se na política tinha o controle total das rédeas, na vida pessoal ele resvalou muito. Quando se encaminhava para um final de cancha previsível, tranquilo, deu uma mancada fatal. Zé Cândido viveu os seus derradeiros anos entre a excitação ilusória de uma nova perspectiva ao quase abandono. Uma quinzena de anos antes, ninguém imaginava que José Cândido de Godoy Netto se despediria como um quase sem-teto, sem plano de saúde e tendo que pedir dinheiro emprestado.

A conta do hospital em que viveu seus últimos instantes foi paga por terceiros. Em 1999, quando este colunista fazia a assessoria de imprensa do seu último governo, entre seus impulsivos acessos de fúria e as tantas histórias que contava, refletiu em voz alta: “O dia que eu não conseguir pagar mais minhas contas, eu me mato”. Isso acabou não se cumprindo, mas era certo que da vida ele tinha se desencantado.

(Coluna publicada na edição semanal - 19 de agosto)

Um comentário:

  1. Grande ladrão. Passou a vida roubando a família, e morreu como mereceu, na miséria, réu em inúmeros processos, e corno, seu maior pesadelo!

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